segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Série de postagens

Realista – O que queremos ser da China?

A reportagem de Keila Candido da Isto É, “O que queremos ser da China?”, demonstra um olhar estratégico do ex-embaixador brasileiro em Pequim, Clodoaldo Hugueney, em que ele propõe que o Brasil deva aproveitar melhor as relações comerciais com o gigante asiático neste momento de novos acordos entre Estados Unidos e União Europeia. Abaixo serão demonstrados alguns trechos que demonstram um olhar mais pragmático e realista do embaixador sobre a postura do Brasil frente a estes acordos e ao bloco do Mercosul:
Segundo o embaixador, a recuperação chinesa é um “bom sinal para o mundo e também para o Brasil, que tem o gigante asiático como o principal parceiro comercial.” Para ele, “o Brasil tem de desenvolver uma estratégia de negócio séria em relação à China e melhorar o comércio com aquele país principalmente em áreas como celulose, milho e carne. Para Hugueney, o Brasil deve desenvolver uma visão estratégica de médio longo prazo, mas antes disso, devemos fazer a pergunta que dá titulo à reportagem: “E nós? O que queremos ser da China? Queremos ser apenas fornecedores de minério de ferro e soja, ou queremos desenvolver um outro tipo de relação com os chineses?”
Em seguida, a jornalista pergunta ao embaixador o que ele “pensa sobre acordos comerciais que estão acontecendo como a Parceria Transpacífico, que será a integração econômica na região Ásia-Pacífico. Hugueney afirma que esse mega acordo está em processo inicial de negociação, mas se isso for levado adiante, vai mudar a configuração do comércio mundial. E o Brasil está onde? Está aqui com o Mercosul, sem saber se leva adiante uma negociação com a União Europeia.
 Hugueney acha que é preciso ao Brasil agilizar as negociações com a União Europeia, pois esta corre o risco de fechar um acordo com o EUA. Segundo ele “os EUA são os maiores produtores de soja do mundo e enorme produtor de carne do mundo, os maiores produtores de suco de laranja, milho, etanol. O Brasil está atrasado para entrar nessa jogada. Esse acordo pode fracassar, mas não dá pra olhar como se ele não existisse. A China vai acabar se integrando nesses esquemas, ela não vai ficar de fora porque é altamente competitiva e depende de comercio mundial”.
 Hugueney diz que o Brasil não deva fechar as portas para a região, “porque todo mundo está trabalhando em esquema de integração regional, ou mais formais ou menos formais. As cadeias produtivas no leste da Ásia estão todas integradas. Mesmo com toda disputa política entre a China e o Japão, eles já realizaram reuniões de negociação comercial. Apesar de ter disputas, eles sabem que a realidade econômica é urgente. A China está agora olhando para parceria transpacífica. Ela não é membro, mas está interessada nisso porque viu que os EUA começaram uma negociação com a Europa, que é algo extremamente difícil de fazer. Temos acompanhar mais isso e participar.”
Por último, a pergunta da jornalista sobre o que o embaixador achava desta sua visão sobre o acordo dos países do Mercosul. Hugueney pensa que o “Brasil tem de seguir com a negociação, mesmo sem os parceiros do Mercosul. Não é mais momento para faz de conta. Nenhum país está mais em momento de faz de conta. Ou vale ou não vale. O Mercosul tem condições de negociar ou não tem? O Brasil não pode deixar esse momento de negociações passar. Em um universo de cinco a dez anos esse panorama pode mudar radicalmente.”
Para os teóricos do neorrealismo, o que importa para os Estados são os elementos estruturais, tais como o sistema anárquico, a balança de poder e o Estado como o ator principal nas relações internacionais. A integração regional é vista como um meio de obter mais poder através do jogo de alianças. As integrações são formadas a partir de ameaças externas seja do ponto de vista político ou econômico. De acordo com a visão do embaixador, as estruturas de integração regional são importantes meios de alianças para superar dificuldades econômicas e diante de ameaças externas de outras integrações regionais, o que pode ser visto no exemplo da ligação da China e do Japão em contraposição à possível ameaça da integração entre EUA e União Europeia. No caso do Brasil, o embaixador diz que o país deve pensar em termos estratégicos, e que as relações brasileiras com o Mercosul devem ser deixadas em segundo plano neste momento, quando mudanças estratégicas globais que podem alterar balanças de poder político e econômico estão em jogo.  Esta visão do embaixador é bastante pragmática e realista, pois pensa em melhores estratégias para equilibrar balanças de poder econômico. Assim, a integração regional para ele somente é viável quando trás ganhos importantes para o país. O caso do Mercosul, que se encontra em difícil fase de evolução das negociações com a União Europeia, o embaixador acha mais viável colocar os acordos regionais em risco e continuar negociando já que o país pode conseguir melhores ganhos fora do Mercosul.

CÂNDIDO, Keila. O que queremos ser da China? Disponível em: <http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/127938_O+QUE+QUEREMOS+SER+DA+CHINA>. Acessado em 10 de setembro de 2013.

Intergovernamentalista – Mercosul – maiores turbulências pela frente?

Na reportagem do Estadão de Roberto Teixeira da Costa: “Mercosul – maiores turbulências pela frente?”, é explicado através do ponto de vista dos empresários brasileiros a crise que a integração sul-americana vem enfrentando nos últimos anos, quando a maioria dos atores econômicos destes países enxergam uma inércia na evolução do bloco. Apesar de uma maior aproximação e diminuição de rivalidade entre Brasil e Argentina desde a criação do Mercosul, as crises econômicas da década de 1990 ainda afetam as relações comerciais destes países.
O problema reside no fato que “Em períodos mais recentes a economia brasileira, bem mais dinâmica que a de nossos vizinhos e com uma classe empresarial bem mais ativa, passou a acumular expressivos saldos na balança comercial”, o que motivou os “nossos vizinhos a passar a adotar medidas protecionistas, cada vez mais severas, para preservar suas reservas cambiais, com forte impacto nas exportações brasileiras.” Com isso, “não existe o mesmo entusiasmo pelo Mercosul, sendo crescente o número de empresários, economistas e outros formadores de opinião que defendem o abandono do bloco como união aduaneira e sua transformação numa zona de livre-comércio. Entre outras razões, pelo fato de não podermos buscar outros acordos comerciais sem que nossos parceiros concordem.”
Há previsões que a Argentina possa entrar em uma nova crise, quando há falta de confiança no país, baixo crescimento e altas taxas de inflação. Isso pode “ampliar as barreiras comerciais, aumentando as dificuldades de exportação” do Brasil. Essa instabilidade econômica dos argentinos cria disputas políticas com o Brasil, o que pode tornar o bloco cada vez mais instável. Há varias correntes a favor de mudanças no Mercosul, como o fim da união aduaneira e a instauração do livre-comércio. 
De acordo com a perspectiva do intergovernamentalismo, podemos ver nesta reportagem alguns aspectos da teoria de Andrew Moravcsik. Segundo o autor, a integração regional pode ser explicada através de três elementos principais: o comportamento racional dos Estados; as preferências dos agentes internos dos Estados; e o processo de barganha inter-estatal. Na reportagem percebemos que as ações estatais são formadas a partir de preferências dos agentes, como os empresários, economistas e formadores de opinião. Estas preferências partem do ponto de vista racional de ganhos destes agentes, e que consequentemente são transmitidas nas ações estatais, que através de barganhas entre Brasil e Argentina procuram estabelecer acordos que os beneficiem mutuamente. A disputa endógena entre os empresários formará a ação externa dos Estados, que no caso do Brasil é procurar diminuir as barreiras comerciais argentinas, ao mesmo tempo em que deve-se partir do ponto de vista racional, quando há indícios de uma crise econômica que poderia acarretar maiores riscos para as relações bilaterais e do Mercosul.

COSTA, Roberto Teixeira da. Mercosul - maiores turbulências pela frente? Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,mercosul--maiores--turbulencias-pela-frente-,1071053,0.htm>. Acessado em 10 de setembro de 2013.

As teorias Funcionalista e neofuncionalista na União Europeia

Duas reportagens do site Jornal de Negócios de Portugal, Inês Balbeira entrevista Antonio Vitorino (António Vitorino: “A integração europeia foi uma apólice de seguros para Portugal”), ex-Comissário Europeu e Maria Joao Rodrigues (Maria João Rodrigues: “Atravessamos uma crise de integração europeia”), Ex-Ministra do Emprego, evidenciando opiniões sobre o papel de Portugal e dos principais Estados do bloco para solucionar a crise que a União Europeia (UE) ainda não conseguiu superar.
Segundo Vitorino, além da crise econômica, a UE vem sofrendo de uma crise de identidade, quando pode haver uma ““mutação constitucional”, onde o espaço muda mas as “regras de jogo” ficam inalteradas” no bloco. Segundo ele, os fundos comunitários para ajudar na crise foram benéficos, mas hoje cessaram e isso se torna um problema para o país sair da crise. Ao contrário do período que Portugal aderiu ao bloco, hoje ele é mais integrado e com número muito maior de países. Assim, diante deste novo cenário, “é essencial para o país continuar nos núcleos de aprofundamento, nomeadamente a moeda única. “É dentro do euro que temos de vencer e é necessário permanecer na moeda única para que Portugal recupere”, disse António Vitorino”. Em sua opinião, é importante que Portugal dê mais atenção às relações franco-alemãs, pois elas são essenciais para o país sair da crise.
Segundo Maria Rodrigues, há uma “divisão profunda” na “crise da Zona Euro”, quando os “Estados-membros devem questionar o papel da Europa enquanto comunidade política, nomeadamente a possibilidade e a vontade de a Europa ser uma comunidade política.” Para ela, “a União Europeia é um projeto inacabado e a atual crise que o bloco europeu atravessa pode ser a oportunidade para acabar este projeto e apaziguar as divisões que se fazem sentir. Uma crise pode ser uma oportunidade, mas pode ser uma oportunidade perdida. E esta crise pode ser a oportunidade para concluir o projeto europeu.”
Assim, podemos elencar alguns pontos nas entrevistas que coincidem com as contribuições da teoria neofuncionalista para Ernest Haas. Segundo o neofuncionalismo, as integrações regionais ocorrem a parir de interesses comuns de agentes domésticos dos Estados em relação aos agentes externos. Partidos políticos, elites econômicas, grupos técnicos e burocracias especializadas podem promover a formação de núcleos funcionais entre os Estados que no futuro pode levar a uma convergência e diversas áreas, o que ele chama da spillover. Segundo ele, é este processo que ocorreu na União Europeia (UE), quando núcleos funcionais geraram interesses na sociedade e que levaram à criação de instâncias supranacionais de integração entre os Estados com o objetivo de aumentar os fluxos econômicos e bem estar das populações.
De acordo com Vitorino, apesar de viver uma fase diferente, neste momento de crise a UE deve continuar investindo nos núcleos de aprofundamento, que são os grupos funcionais de Haas. Os fundos europeus de auxílio e a continuidade da moeda única são elementos que Vitorino compreende serem indispensáveis para o não retrocesso da integração europeia. Além disso, a criação de expectativas no sucesso das relações de França e Alemanha para o futuro da integração é outro elemento da teoria de Haas, quando a integração passa a criar lealdade e expectativas entre os membros.  Para Maria Rodrigues, a UE passa por uma crise que gera oportunidade de terminar projeto de integração e que somente através do aprofundamento de novos instrumentos, de novos núcleos funcionais, a integração europeia poderá seguir seu curso de conclusão. Este é outro elemento que condiz com a teoria de Haas.
O que podemos perceber é que as ideias da teoria neofuncionais estão presentes pelo menos no cenário político português, e que estes núcleos funcionais realmente são elementos que podem gerar convergências e novas expectativas entre agentes de diferentes Estados.

BALREIRA, Inês. Maria João Rodrigues: “Atravessamos uma crise de integração europeia”. Disponível em:  <http://www.jornaldenegocios.pt/economia/detalhe/maria_joao_rodrigues_atravessamos_uma_crise_de_integracao_europeia.html>. Acessado em 09 de setembro de 2013.

______. António Vitorino: “A integração europeia foi uma apólice de seguros para Portugal”. Disponível em: <http://www.jornaldenegocios.pt/economia/detalhe/antonio_vitorino_a_integracao_europeia_foi_uma_apolice_de_seguros_para_portugal.html>. Acessado em 09 de setembro de 2013.

Construtivismo na União Europeia

Na reportagem do site Expresso XL de Portugal, Henrique Monteiro questiona o apoio de grande parte da população portuguesa à independência da região Catalunha. Segundo o autor, o centralismo de Madrid e o fato de boa parte das riquezas da Catalunha serem empregadas para o sustento de outras regiões mais pobres da Espanha (além de rivalidades históricas) são os grandes motivos do movimento separatista que visa tornar a Catalunha um Estado-nação. Por estar mais próxima do centro da Europa, a região catalã conseguiu se beneficiar melhor da industrialização, e por isso goza de certa estabilidade econômica enquanto a Espanha é um dos países mais afetados pela crise.  
Nas próprias palavras de Monteiro, “na Checoslováquia, a separação da República Checa da Eslováquia também seguiu a ideia de mais ricos (checos) a deixarem mais pobres para trás (Eslováquia) e na Eslovênia o caso não foi muito diferente, quando se separou como país independente da Sérvia, a que historicamente estava ligada. Podem seguir-se a Escócia e a Flandres e assim se pode consagrar a decomposição de uma Europa que era para ser solidária, mas que aos poucos mostra a natureza de que sempre foi feita”. Assim, para ele a independência da Catalunha e prejudicial para Portugal e para a UE, pois isso pode levar ao enfraquecimento de todo o bloco europeu. Em um momento que deveria haver mais solidariedade dentro do Continente diante da crise,  há uma tentativa dos ricos abdicarem dos problemas dos mais carentes.
De acordo com a teoria construtivista de Emmanuel Adler e Alexander Wendt, os aspectos coletivos também são importantes nas tomadas de decisão de agentes, no qual aspectos cognitivos, ideias, crenças e interpretações normativas devem ser incorporadas ao pensamento racional e materialista que domina as principais teorias vigentes. Para os construtivistas, as instituições regionais tem o papel não só de contribuir economicamente para as populações, mas de criar também entendimentos coletivos, mudando o comportamento dos povos e dos Estados.
Monteiro exibe em sua reportagem que há históricos semelhantes ao do separatismo catalão, quando uma população mais rica não mais quer arcar com os custos de uma população mais pobre, como o caso da Tchecoslováquia. Mesmo assim, pela ideia do autor, há um senso de coletividade na Europa, quando se vê que o bem estar do bloco pode ser mais benéfico que rivalidades entre vizinhos. Apesar de ser apenas o ponto de vista do autor, percebemos que sua indignação pode ser consequência de uma cultura de pertencimento à região europeia criada a partir da constituição da integração econômica, mas que passa a atingir elementos cognitivos que vão além de condições materiais.

MONTEIRO, Henrique. A independência da Catalunha é uma má ideia. Disponível em: <http://expresso.sapo.pt/a-independencia-da-catalunha-e-uma-ma-ideia=f830180>. Acessado em 09 de setembro de 2013.



RELAÇÕES ENTRE AS TEORIAS DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS E OS PROCESSOS DE INTEGRAÇÃO REGIONAL



Integração para o Realismo – Parte 1

O realismo é uma teoria cujo foco principal são as configurações externas de poder em um ambiente internacional marcado pela anarquia, o que leva a uma lógica de auto-ajuda e competição entre os Estados, onde estes estão sempre buscando aumentar ou defender o seu poder, dando importância as políticas que se referem a segurança e política externa. Os autores desta corrente têm o Estado racional como ator principal nas relações internacionais, sendo portanto uma teoria estadocêntrica (MARIANO, 2004).
 Alguns conceitos importantes para os realistas são os de balanço de poder e hegemonia. Diferentemente de outras teorias o realismo se preocupa com os aspectos externos aos Estados, onde as questões internas não são discutidas e não tem peso para as interações entre os estados.

Integração para o Realismo – Parte 2

A teoria realista é uma teoria estadocêntrica, colocando os estados como os atores no cenário internacional. Para estes atores existe um caráter hierárquico na política, onde a “high politics”, que são políticas relativas a política externa e segurança são superiores a “low politics”, que são as questões internas aos estados. Assim os estados são atores racionais que buscam maximizar seu poder, o que confere um caráter conflituoso ao sistema internacional, que é anárquico, não havendo uma estrutura superior aos estados para governá-los (MARIANO, 2004).
Dado tal cenário, a integração entre estados é vista como uma formação de aliança em resposta aos desafios externos, aliança esta de curto prazo, seja para contrabalancear o poder do hegemon ou mesmo para se unir ao Estado hegemônico para aumentar seu poder de barganha, tendência existente entre os Estados fracos (HURRELL, 1995). Assim os conceitos de balança de poder e hegemonia são incorporados ao processo de integração. É importante destacar que diferente de outras teorias, os realistas não acreditam que exista um compartilhamento de soberania entre os estados que se integram, o caráter dominante do Estado continua mesmo com a integração.

Integração para o Funcionalismo – Parte 1

O funcionalismo foi criado por David Mitrany e é uma teoria criada para pensar os instrumentos necessários para aproximar as nações pacificamente, rompendo com o elo autoridade/território existente nas teorias existentes até então. A proposta de Mitrany expõe um modelo funcionalista e pragmático para observar a integração através de uma visão técnica (MARIANO, 2004).
As instituições internacionais são criadas para lidar com questões técnicas, que devido ao aumento das interações entre os estados se tornaram mais complexas, exigindo um maior envolvimento entre estes. Quando os problemas técnicos são separados das questões políticas, por meio das instituições, a integração pode ser desenvolvida, onde esta, através da doutrina da ramificação, se espalharia para outros setores e campos técnicos, aumento a necessidade de cooperação, levando até a integração entre os países.

Integração para o Funcionalismo – Parte 2

Para os teóricos do Funcionalismo, com destaque a Mitrany, o processo de integração se dá por uma transferência de soberania e lealdade, onde estas são transferidas do Estado nacional para as instituições supranacionais.
A doutrina da ramificação, na qual a necessidade de colaboração técnica em um setor é resultante de uma necessidade que pode gerar a necessidade de colaboração funcional em outros setores, explica o aumento da integração entre os Estados, levando estes a transferir suas soberanias, transferência esta que é parcial. Mitrany criou sua teoria para entender a maneira de como manter uma coexistência pacifica entre os Estados, aproximando-os e mantendo a paz na Europa.
A necessidade de integração para os Estados se dá a partir do momento em que os problemas de natureza técnica não são resolvidos por estes internamente, havendo por meio da ramificação uma ampliação da necessidade de se integrar, quando benefícios são observados, levando inclusive a cooperação que se iniciou em questões técnicas para um estágio de cooperação política (MARIANO, 2004).

Integração para o Neofuncionalismo – Parte 1

O neofuncionalismo cujo principal expoente é Ernst Haas define integração como o processo no qual os atores políticos nacionais são persuadidos a transferir suas lealdades, expectativas e atividades políticas para um novo centro, cujas instituições possuem ou demandam jurisdição sobre os Estados. Embora tenha bastante aspectos em comum com o funcionalismo, alguns aspectos importantes diferem esta teoria da primeira. A integração não é um processo espontâneo, havendo então a necessidade dos atores internos, os políticos de iniciá-la, onde uma vez alcançada a supranacionalidade, a irreversibilidade do processo de integração ocorre.
De acordo com Karina Mariano, para os neofuncionalistas existem quatro motivos que levam os Estados a buscar a integração, que são:

1.      A promoção da segurança comum;
2.      A busca pelo desenvolvimento econômico;
3.      Interesse de um Estado mais forte de controlar aliados menores;
4.      Existência de uma vontade comum entre as nações de unificar suas sociedades para entidades mais amplas.

O processo de integração para os neofuncionalistas se inicia a partir de um núcleo funcional formado por governos, elites, partidos políticos, técnicos e burocracias especializadas, onde através do processo de spill-over, onde são criados estímulos a integração pela adesão de novos atores e setores, este se amplia. Assim são geradas novas demandas e setores que aumentam a integração, havendo a transferência gradual de lealdades, o que leva a uma supranacionalidade, criando uma nova identidade regional, o que garante a irreversibilidade do processo de integração.

Integração para o Neofuncionalismo – Parte 2

O neofuncionalismo parte do modelo funcionalista elaborado por Mitrany e este pensa o processo de integração europeu, enfatizando o papel dos grupos de interesses, e partidos políticos internos ao Estado. Os autores neofuncionalistas acreditam que o processo de integração se da pela transferência de lealdades e expectativas dos Estados para um novo centro supranacional, onde as instituições terão uma jurisdição que ultrapassará a do Estado (MARIANO, 2004).
Ernest Haas é o principal expoente da doutrina neofuncionalista e este propôs que a integração parte de um núcleo central formado pelas elites do Estado que dão inicio as negociações de integração. Haas afirma que se as elites de uma região tem suas expectativas em convergência e veem a integração como benéfica surgirá uma movimentação interna que sustentará o processo de integração. Esta decisão de se integrar será impulsionada pelo fenômeno do spill-over, ou derramamento para outros setores, que englobarão novos atores, aprofundando a integração, levando esta a um caráter supranacional, que garante a irreversibilidade do processo.

Integração para o Construtivismo – Parte 1

O construtivismo busca adicionar novas variáveis e agentes cujos interesses, ideias e laços em comuns formam as estruturas normativas das relações internacionais. Para esta teoria as experiências vividas pelos atores e a estruturas das sociedades influenciam na construção das ideias e por sua vez na tomada de decisão dos atores, o que da um caráter epistemológico a teoria construtivista.
A teoria construtivista se situa entre as teorias recionalistas e interpretativistas de RI pelo fato de dar importância ao material, o que da seu caráter racionalista e as ideias, onde as interações dos atores criam suas identidades e ideias, meios pelo qual percebemos a realidade material. Tal importância dada aos valores, ideias e interação entre as sociedades da teoria construtivista levam a conclusão de que o mundo em que vivemos é construído socialmente, mais uma vez ligando o material e o subjetivo. O poder para tal teoria é um recurso para impor uma visão própria aos outros atores, é um recurso que determina as condições de acesso aos bens e determina os significados compartilhados que formarão as identidades (MARIANO, 2004).

Integração para o Construtivismo – Parte 2

 De acordo com Adler o construtivismo enfatiza a importância das estruturas normativas e materiais na construção das identidades que definirão as decisões políticas. Assim a realidade é construída socialmente, onde os valores e ideias dos atores influenciam na realidade material, o que da importância igual as duas realidades: "Construtivismo é a perspectiva segundo a qual o modo pelo qual o mundo material forma a, e é formado pela, ação e interação humana depende de interpretações normativas e epistêmicas dinâmicas do mundo material" (ADLER, 1999, p. 205).
Existem três pressupostos básicos na teoria construtivista:

1.      Existe um peso igual nas estruturas normativas e materiais;
2.      Estruturas que não são materiais como as ideias e experiências vividas devem ser consideradas na construção dos interesses;
3.      Os interesses dos atores dependem de suas identidades construídas.

Assim, para os construtivistas a integração regional é dada através da junção de atores com interesses, ideias e imagens em comum, formando assim uma estrutura normativa que dará início a integração.  A integração causará uma transferência de lealdades e expectativas a um novo centro, onde haverão diversas reconstrução de ideias e assim das identidades, que aumentarão o entendimento coletivo dos atores, dando assim sua identidade regional, o que dará um caráter mais duradouro a integração.

ADLER, Emanuel. "O Construtivismo no Estudo das Relações Internacionais" in Lua Nova, n.47. São Paulo: CEDEC, 1999. p. 201 - 246.
HAAS, Ernst B. International Integration: The European and the Universal Process. International Organization, 15, p. 366-392, 1961.HURRELL, Andrew. O ressurgimento do Regionalismo na Política Mundial. Contexto Internacional, Rio de Janeiro, vol.17, n.1, jan/jun 1995, p. 23-59.
MARIANO, Karina Pasquariello. Nova visão das teorias de integração regional: um modelo para a América Latina. Unesp, 2004 (Relatório Fapesp).

FUNCIONALISMO, NEOFUNCIONALISMO E CONSTRUTIVISMO



A seguir serão apresentadas as principais considerações a respeito de três teorias de integração regional: funcionalismo, neofuncionalismo e construtivismo, assim como as relações entre cada teoria e os processos de Integração Regional.

Funcionalismo e neofuncionalismo

Dentro do escopo das teorias sobre os processos de integração regional, o Funcionalismo figura como uma das teorias clássicas, definidas cronologicamente por Milnek e Mansfield como a primeira geração de discussão conceitual sobre o tema, juntamente com o Intergoverntamentalismo (ou liberal institucionalismo), entre as décadas de 1950 e 1980.
O principal autor da teoria funcionalista é David Mitrany, que elabora a Teoria da Ramificação em 1943. Esta, por sua vez, serve de base para um dos principais conceitos do neofuncionalismo, o spill-over de Haas (1970).
A teoria de Mitrany (1990) traz a ideia de que o processo de integração é iniciada por problemas  técnicos compartilhados entre os Estados da região, o que leva a uma aproximação liderada por elites técnicas, de forma a buscar uma integração por meio das instituições. Desta forma, quando a cooperação com objetivo de solucionar problemas técnicos tem resultados funcionais, ou positivos, a ideia da cooperação se prolifera para outros setores, gerando necessidade de colaboração funcional em diferentes áreas.
Além disso, a teoria funcionalista traz a ideia de que a integração faz com que os Estados compartilhem sua soberania em assuntos específicos dos Estados em busca de resultados positivos, supondo que a integração regional traz bons resultados (é necessário levar em conta que a teoria foi desenvolvida a respeito da integração da Comunidade Europeia e pode não ser aplicável a outras situações).
Outros pontos importantes  sobre a contribuição do funcionalismo são que, primeiramente, é a primeira teoria não-marxista do século XXI que propõe uma análise dos Estados para além do nível nacional, ou seja, levando em conta outros autores. Além disso, a teoria contribuiu para os estudos contemporâneos para o transgovernamentalismo e, finalmente, apresenta a possibilidade de separação entre poder político e outros temas de low policy (como meio ambiente, desemprego e welfare).
Algumas décadas após o surgimento da teoria funcionalista, nos anos 1950, surge a teoria neofuncionalista, cujo principal autor é Haas. Ele traz o conceito de spillover, que pode ser considerado um desenvolvimento da teoria da ramificação de Mitrany.
A teoria neofuncionalista é definida por Hurrell (1995) como sendo de segundo nível, que abarca as teorias que enfatizam uma estreita ligação entre regionalismo e interdependência. No caso da teoria aqui comentada, existe um papel muito relevante das instituições no processo de integração, principalmente as do tipo supranacional, que podem atingir um papel até mesmo mais importante que as instituições nacionais dos membros.
Já Mattli (1999) destaca que esta supranacionalidade é o único método possível para os Estados garantirem a máxima segurança em um processo de cooperação regional, porém a teoria peca em não especificar em que condições as demandas supranacionais são aceitas no nível nacional.
O autor Haas traz ainda outras contribuições, definindo a integração como um processo liderado por atores políticos e outros atores domésticos nacionais  tomam uma iniciativa de transferir suas lealdades, expectativas e atividades políticas para um novo e maior centro. Este centro possui instituições que possuem ou demandam jurisdição sobre os Estados membros, realizando uma transferência gradual de lealdade que faz com que se crie uma nova identidade, a regional.
Algumas motivações apresentadas pelo autor a respeito da integração são, primeiramente, fatores externos, como as ameaças externas, que criam a vontade de criar políticas de segurança comum. Além disso, existe a promoção da cooperação para obter desenvolvimento econômico e aumento do bem-estar social dos membros. Outro fator externo é minimizar a influência do hegemon na região, além da vontade de estabelecer um cenário pacífico e equilibrado, entre os Estados.
O processo de integração é explicado por Haas com o spillover, que se inicia com a formação de um núcleo funcional, formado por governos, elites, partidos políticos, técnicos e burocracias especializadas, com capacidade autônoma para provocar outros estímulos à integração com a adesão de novos atores e setores.
Estes líderes estabelecem as novas demandas, que, ao contrário do que afirma Mitrany, podem ser iniciadas com setores não somente técnicos e econômicos, que levam a uma necessidade de se criar instituições supranacionais, levando ao compartilhamento de expectativas e lealdades entre os Estados-membros.
É interessante ressaltar que este processo tem três diferentes fases. Primeiramente existe a chamada acomodação por meio do mínimo denominador comum, quando existe ainda muita barganha e competição entre os Estados, que agem ainda de forma egoísta e sem levar muito em conta as demandas da sociedade. Posteriormente temos a acomodação pela divisão das diferenças, sendo que as barganhas são reduzidas e utilizam grupos ad hoc e organizações econômicas internacionais para serem mediadores nas negociações. Finalmente temos a etapa do spillover em si, com o aprofundamento dos interesses comuns das partes, formando uma comunidade política com jurisdição legislativa e judicial completa.
Em adição, McGowan é um autor contemporâneo que revisita a teoria neofuncionalista de Haas e, em seu texto publicado em 2007, afirma que a teoria ainda é válida para analisar a integração europeia, mesmo que não consiga explicar todo o processo integralmente. Ele destaca que a teoria trouxe noções do pluralismo social e do spillover como determinante da dinâmica do processo de integração, além de ter se focado em grupos da sociedade ao invés de considerar apenas as decisões de executivos ou dos Estados, como outras teorias.
Além disso, destaca que a teoria neofuncionalista surgiu como uma tentativa de explicar o quê e por quê o processo de integração europeia estava acontecendo, ao invés de apresentar considerações descritivas sobre os fatos. Além disso, destaca que nenhuma outra teoria da integração foi tão criticada e atacada, de forma que ela pôde refinar sua ideia de spill-over de forma que este processo tornou-se capaz de explicar como os atores internacionais desenvolvem interdependências tão latentes. Desta forma, McGowan defende com sucesso a ideia de que o Neofuncionalismo continua relevante para explicar o processo de integração europeu.

Teoria Construtivista


De acordo com o próprio nome da teoria, o Construtivismo tem como premissa principal a ideia de que a política internacional é socialmente construída. Nela os atores influenciam a construção da estrutura social e ao mesmo tempo são influenciados por essa mesma estrutura no processo de interação. Desta forma, as ideias e normas são importantes na constituição da realidade e dos interesses dos atores. Para o Construtivismo os fatores materiais não são descartados; sua relevância é admitida como fundamental, porém entende-se que estes sejam frutos das ideias. Assim, as ideias seriam a base material do sistema (WENDT, 1999).
A teoria Construtivista faz parte do chamado terceiro debate das Relações Internacionais, que envolve a discussão entre Construtivismo e Racionalismo. Para o Racionalismo, os atores do sistema internacional agem racionalmente, de acordo com uma análise hierárquica da escolha de seus objetivos, considerando um cálculo de custo-benefício em busca da maximização de seus lucros e da minimização de seus custos. Já o Construtivismo acredita que as preferências dos atores sejam formadas durante o processo de interação destes com o sistema internacional, podendo sofrer transformações (e transformando o sistema) à medida que entram contato com a estrutura em que estão inseridas.
Wendt (1999) analisa o sistema internacional a partir da divisão entre micro e macro estruturas, sendo as microestruturas as partes que interagem entre si e a macroestrutura o sistema como um todo. As estruturas são consideradas sociais pois, ao agirem, os atores levam em conta uns aos outros, moldando suas ações de acordo com a expectativa da atitude do outro, sendo esta baseada na identidade de cada um. Os interesses de cada agente são definidos por suas identidades e estas identidades nacionais são influenciadas pela própria interação entre os agentes.
Para o Construtivismo as identidades nacionais são inerentes aos Estados e estas definirão suas práticas e seus interesses, considerando, no entanto, que estes sofram transformações. A integração regional é entendida como uma formação de identidade coletiva, sem que deixe de existir a identidade nacional. Este processo de daria pela união de agentes não só com interesses comuns, mas também unidos por laços históricos e culturais iguais (ADLER, 1997).
Assim, o Construtivismo aborda as Relações Internacionais de uma perspectiva social, atribuindo uma flexibilidade à estrutura internacional e às identidades coletivas, sendo estes mutuamente influenciados durante o processo de interação. Alguns estudiosos consideram que o Construtivismo não deva ser considerado uma teoria mas sim um diferente enfoque de análise das RI pois não seria um conceito homogêneo, sendo ele próprio constituído por uma variedade de perspectivas.

Tabela de Teorias

Levando em conta as teorias aqui apresentadas e as anteriormente apresentadas, foi possível confeccionar uma tabela que resume as premissas e a relação de cada teoria com os processos de integração regional:


Premissas
Relação entre a teoria e os processos de Integração Regional
Teoria Realista
Sistema internacional anárquico; Estados como principais atores; Busca pela hegemonia; Balança de poder; Cenário potencialmente conflituoso
 A integração regional seria uma forma dos países garantirem sua segurança no sistema. Além disso, o Realismo aponta que estes processos sempre são conduzidos por uma hegemonia regional.
Teoria Liberal (Liberal Intergovernamentalismo) 
Comportamento racional do Estado; Negociação interestatal; Formação das preferências; Estado como ator central
Governos analisam suas escolhas e preferências de forma pragmática e racional. A formação da preferência nacional ocorre primeiramente no âmbito doméstico e, posteriormente, o Estado barganha com outros Estados, para conseguir seu objetivo
Funcionalismo
Compartilhamento de soberania, discussão no nível técnico (cooperação funcional) e transferência de lealdades
Integração faz com que os Estados compartilhem sua soberania em assuntos específicos dos Estados em busca de resultados positivos
Neofuncionalismo
Transferência/Compartilhamento de expectativas e lealdades; Spill-over; Papel dos políticos, grupos de interesse e elites domésticas em destaque; Integração não se dá de forma automática
A sociedade civil e as agências supranacionais desempenham papel decisivo na integração e no consequente compartilhamento da soberania entre os Estados-membros. A iniciativa destes grupos internos gera spill-overs econômicos e políticos que trazem continuidade ao processo de integração
Construtivismo
Realidade socialmente construída; As estruturas, as identidades e os interesses dos atores são construídos por ideias compartilhadas e mutuamente influenciados.
A integração regional é entendida como uma formação de identidade coletiva, sem que deixe de existir a identidade nacional. Este processo de daria pela união de agentes não só com interesses comuns, mas também unidos por laços históricos e culturais iguais.

Fonte: Elaboração própria.
ADLER, Emanuel. O Construtivismo no Estudo das Relações Internacionais. Traduzido do original “Seizing the Middle Ground: Constructivism in World Politics”, in European Journal of International Relations, 1997.
HAAS, Ernst. The Study of regional integration: reflections on the Joy and Anguish of pretherorizing. International Organization, vol. 24, Issue 04, September 1970, p. 606-646. 
MARIANO, Karina Pasquariello. Nova visão das teorias de integração regional: um modelo para a América Latina. Unesp, 2004 (Relatório Fapesp). Capítulos 1 e 2. 
MITRANY, David. A paz por meio da cooperação e da integração. In: BRAILLARD, Philippe. Teoria das Relações Internacionais. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1990.

domingo, 15 de setembro de 2013

INTERGOVERNAMENTALISMO LIBERAL

INTERGOVERNAMENTALISMO LIBERAL

O objetivo do artigo de Moravcsik é reformular a teoria liberal de RI para uma forma não utópica, que seja empírica. A teoria liberal prega que as relações estado-sociedade tem um impacto fundamental no comportamento do Estado nas políticas mundiais. As ideias da sociedade e seus interesses influenciam o comportamento dos Estados ao moldar suas preferências. Para o autor, a teoria liberal deve ser tratada da mesma forma que as teorias realistas e institucionalistas, pois para este o liberalismo é constantemente ignorado sendo “acusado” de utópico, normativo e ideológico. O autor, a seguir, mostra algumas criticas que foram feitas ao liberalismo: “deveria ser considerada uma abordagem e não uma teoria em si, devido ao fato que suas proposições não poderem ser deduzidas de seus pressupostos”.
Moravcsik propõe uma série de pressupostos que mostrarão que a teoria liberal pode ser sim pensada de maneira positivista e empírica através da analise da centralidade das relações estado-sociedade. Ele então elabora três variantes da teoria liberal: Liberalismos ideacional, comercial e republicano.
Depois o autor mostra que a teoria liberal possui sim método e empirismo através de quatro critérios: Uma teoria deve ser geral – em que ele mostrará que o liberalismo é uma teoria geral que liga RI com outras áreas. Deve ser rigorosa e coerente. Deve mostrar precisão empírica e deve mostrar consistência multicausal.

Pressupostos básicos da teoria liberal de RI

1- A primazia dos atores estatais – Os atores fundamentais na política internacional são indivíduos ou grupos privados, que são, em média, racionais e avessos ao risco que promovem seus interesses baseados nas restrições impostas pela escassez de matéria e valores conflitantes.
A teoria liberal se baseia em uma visão “bottom-up” em que as demandas dos indivíduos e grupos da sociedade são analisadas com “mais prioridade” do que as das políticas. Os indivíduos definem seus interesses independentemente da política, e após definirem estes usam da troca política e da ação coletiva para alcança-los. Eles agem racionalmente para perseguirem seu bem estar: material e ideal. Para os liberais a definição dos interesses dos atores da sociedade é central. Eles rejeitam a noção utópica de que existe uma harmonia de interesses entre indivíduos e grupos na sociedade, onde a escassez de materiais e as diferenças entre si levam a competição.
A teoria liberal tenta generalizar sobre as condições em que o comportamento dos atores que convergem em cooperação ou conflito. Diferenças irreconciliáveis de crenças sobre bens públicos, fronteiras, cultura, praticas sociais, instituições políticas, levam ao conflito, enquanto crenças complementares promovem harmonia e cooperação.
2- Representação e preferências dos Estados – Estados representam conjuntos da sociedade doméstica e agem de acordo com os interesses destes.
Na concepção liberal de políticas domesticas o Estado não é um ator e sim uma instituição representativa dos atores sociais. A política governamental é então constrangida pelos interesses e busca de poder dos indivíduos e grupos que constantemente pressionam os tomadores de decisão a perseguir políticas que vão de acordo com suas preferências. Nenhum governo é uma representação universal onde em cada governo as preferências de certos indivíduos são mais representadas do que as de outros. Segundo Moravcsik “Mesmo onde as instituições públicas são justas e abertas uma relativa diferença de distribuição de propriedades, risco e informação pode criar monopólios sociais e econômicos que serão capazes de dominar a política”.
Instituições e práticas representativas não apenas determinam quais as coalizões sociais serão representadas na política externa, como também determinam a forma como eles são representados. Esta forma pode ser unitária ou desagregada, em que diversas áreas da política externa há uma forte coodernação entre oficiais do Estado e políticos e, em outras esta pode ser desagregada, o que conduz a uma serie de políticas externas semiautônomas que servem a interesses sociais diferentes. Esta pode ser também estruturada de uma forma a se usar uma extrema racionalidade, ou de maneira menos racional. Isto significa que os estados não fixam automaticamente concepções homogêneas de segurança, soberania ou riqueza como pregam os realistas e institucionalistas, estas são “funcionalmente diferenciadas”, a natureza e intensidade de suporte nacional para qualquer propósito do estado varia decisivamente de acordo com seu contexto social.
3 - Interdependência e o sistema internacional – A configuração das preferências independentes do estado determinam o comportamento deste.
Os Estados necessitam de um propósito para provocar conflitos, promover cooperação ou mover qualquer ação significante na política externa, assim cada Estado busca realizar suas preferências de acordo com as restrições impostas pelas preferências de outros Estados. A teoria liberal rejeita a suposição realista de que as preferências estatais devem ser tratadas como naturalmente conflituosas e também a institucionalista de que estas devem ser tratadas como parcialmente convergentes.
O link entre as preferências estatais e seu comportamento se baseia no conceito de interdependência política, definida como o conjunto de custos e benefícios criados pelas sociedades estrangeiras quando grupos dominantes nestas buscam realizar suas preferências, “o padrão de externalidades resultantes das tentativas de perseguir fins distintos nacionais.”. Onde as externalidades de políticas unilaterais são ótimas para outros, existe um forte incentivo para se coexistir com baixos conflitos; porém onde um grupo social dominante em um país busca realizar suas preferências através da ação estatal de forma a necessariamente impor custos aos grupos dominantes de outros países há um alto potencial para tensões e conflitos. Assim a forma de cooperação ou não, depende diretamente dos padrões de preferências, custos e riscos das partes.
Por fim o autor fala que uma diferença entre os liberais e os realistas e institucionalistas é que os primeiros se focam no que precede as ações enquanto realistas e institucionalistas focam no “depois”. Ele explica isso com o seguinte exemplo: o aumento dos gastos militares em resposta ao acúmulo de armas do adversário é uma mudança de estratégia com preferências fixas consistentes com o realismo, enquanto um aumento dos gastos iniciado por uma nova elite dominante ideologicamente comprometida com o aumento de seus territórios é uma mudança de preferência induzida, com uma estratégia condizente ao liberalismo.
A concepção liberal de poder é baseada em uma suposição mais relacionada com as teorias de barganha e negociação, uma vez que entre as preferencias do Estado encontra-se a busca por expandir seus recursos. Dessa forma, o ato de barganha representa uma preferencia estatal. A visão liberal sobre o poder político, assim entendido, gera explicações plausíveis não apenas para questões de cooperação entre nações, mas para uma ampla gama de fenômenos que são centrais nos estudos de política mundial, que variam desde momentos de paz até as guerras brutais.
As três suposições fundamentais do liberalismo (explicadas acima), separadamente não representam muito.  Estas suposições, no entanto, apoiam três variações da teoria liberal, são elas: ideacional, comercial e o liberalismo republicano. E cada um deles se apoia em especificações distintas da teoria liberal. Nas demandas sociais, por exemplo, que são os mecanismos causais por meio de que são transformados nas preferências estatais. O liberalismo ideacional, portanto, foca na capacidade das preferencias sociais legitimarem instituições políticas e regulações socioeconômicas. O liberalismo comercial foca nos incentivos criados por oportunidades transnacionais de transações econômicas. Por fim, o liberalismo republicano foca na natureza de representações domésticas com o intuito de derivar renda econômica pela manipulação do ambiente social e político. O autor especifica cada uma delas.

Implicações mais amplas da Teoria Liberal

Para Moracvisk:

Para demonstrar a sua utilidade para a pesquisa empírica e pesquisa teórica, uma afirmação paradigmática como esta deve cumprir quatro critérios: Primeiro, seus pressupostos devem destacar as conexões conceituais inexploradas entre as hipóteses liberais previamente não relacionadas. Em segundo lugar, deve definir claramente seus próprios limites conceituais conforme a teoria social fundamental, neste caso, distinguir claramente as hipóteses liberais de hipóteses ideológicas ou históricas. Em terceiro lugar, deve revelar as anomalias e fraquezas metodológicas nas teorias anteriores, criando novas presunções sobre as teorias e métodos adequados que estruturam uma pesquisa empírica. Em quarto lugar, deve definir como a teoria em questão pode ser combinada de forma direta e não aleatoriamente com outras teorias para formar explicações coerentes. (MORACVISK, 1997, p. 533)

Liberalismo como uma teoria geral

Uma vantagem da teoria liberalista é que conecta uma ampla gama de hipóteses distintas e independentes relativas a áreas previamente inexplicáveis ​​pelas teorias existentes. Assim, a teoria liberal desafia a suposição convencional de que o realismo é a mais abrangente e parcimonioso das principais teorias de RI. Suas três variantes – ideacional, comercial e liberalismo republicano – são mais fortes quando analisadas em conjunto.
A Teoria liberal também ilumina pelo menos três grandes fenômenos os quais o Realismo e o Institucionalismo oferecem poucas explicações. Primeiro, a teoria liberal fornece uma explicação teórica plausível para a variação no conteúdo substantivo da política externa. Nem o Realismo nem Institucionalismo explicam as mudanças dos objetivos e propósitos sobre as quais os Estados conflitam ou cooperam.
Em segundo lugar, a teoria liberal oferece uma explicação plausível para a mudança histórica no sistema internacional. O caráter estático de ambas as teorias realista e institucionalista, e a sua falta de uma explicação para a mudança de longo prazo da política internacional é uma fraqueza reconhecida. A Teoria liberal, pelo contrário, forja uma ligação causal direta entre as mudanças econômicas, políticas e sociais e o comportamento do Estado na política mundial.
Em terceiro lugar, a teoria liberal oferece uma explicação plausível para a distinção da moderna política internacional. Entre as democracias industriais avançadas, uma forma estável de política interestatal surgiu, baseada em expectativas confiáveis ​​de mudança pacífica, no regimento interno do Direito, em instituições internacionais estáveis​​, e interação social intensa – a chamada interdependência complexa.

Os limites comerciais do liberalismo: porque o regime funcionalista não é liberal

Outra vantagem da reformulação das teorias é esclarecer a divergência fundamental entre as teorias de preferências Estado-cêntricas e as teorias modernas centradas nos regimes internacionais. O liberalismo permite que as preferências do governo variem, explica a política como uma função do contexto social e se concentra em como o conflito doméstico, não a anarquia internacional, impõe resultados sub-ótimos.
Isto não quer dizer, no entanto, que a teoria liberal seja inútil na análise dos regimes internacionais. Pelo contrário, contribui para uma tal análise, em pelo menos duas formas distintas. Primeiro a teoria liberal explica quando e por que a configuração das preferências do Estado é provável que surja. A configuração de preferências nos permite prever características detalhadas dos regimes internacionais.
Além disso, a teoria liberal aprofunda a explicação institucionalista da estabilidade do regime. A teoria liberal sugere uma hipótese alternativa: ou seja, que os regimes internacionais são estáveis ​​quando os indivíduos e os grupos sociais se ajustam de modo a fazer uma inversão da política interna.

Implicações metodológicas da teoria liberal: o perigo da omissão

Uma terceira vantagem potencial de reformular uma teoria cientifica social é aumentar sua saliência, enfatizando estudos empíricos para a consideração das hipóteses. Poucos estudos confrontam as hipóteses do realismo e institucionalismo (ou construtivismo), omitindo variáveis que poderiam ter grande significância para as teorias. (não entendi direito, mas o autor da um exemplo). O exemplo é sobre a critica realista de Joseph Grieco sobre os ganhos relativos de barreiras não tarifarias, quando o autor diz que problemas de segurança e não medo de trapaças futuras é o motivo da não cooperação. Moravcsik diz que se Grieco reconhecesse algumas premissas da teoria liberal, não estaria omitindo a resposta da sua critica. Ao invés de focar apenas nas questões estruturais e o papel do Estado (premissas realistas), Grieco deveria reconhecer o papel das instituições, ideias e conflitos domésticos, todas premissas liberais ignoradas. Segundo Moravcsik, na questão dos ganhos relativos, as pressões domesticas dos Estados influenciam diretamente as decisões estatais, mas que são omitidas pelas criticas realistas.
O segundo exemplo é sobre os esforços de concretização do construtivismo como teoria de RI. Assim como o realismo, o construtivismo procura se esquivar de confrontos com a teoria liberal, omitindo suas principais premissas. O autor diz que a falta de embate entre os princípios construtivistas contra os liberais inflam o suporte à consolidação do construtivismo. Moravcsik diz que para teorizar rigorosamente sobre a construção social sistêmica, antes ela deve requerer a teoria liberal. Segundo ele, antes da ideia construtivista de construção social sistêmica através das ideias, devemos primeiro observar as convergências e divergências entre as ideias das instituições internas, premissa essa de cunho liberal. Assim, a analise coloca dois desafios ao construtivismo. A primeira sugere que as variáveis liberais são mais fundamentais que as construtivistas, por que elas definem as condições onde altas taxas de comunicação e transação altera o comportamento do Estado. A segunda sugere que os fatores liberais domésticos são melhores para a explicação da paz e transições do que as construtivistas. Diz que a política mundial seria melhor entendida diante de um debate empírico entre construtivistas e liberais.
Os exemplos mostram que é essencial tratar o liberalismo como uma constante base teórica contra as hipóteses realista e construtivista. A falha em analisar as preferências estatais confundiram os realistas em diferentes analises: deterrence, influencia hegemônica, formação de alianças, negociações internacionais, cooperação monetária internacional, cooperação multilateral, sanções econômicas e integração europeia. Em alguns casos, como o realista Walt e o construtivista Wendt, já reconhecem alguns princípios liberais, como as “intenções” serem inseridas no realismo e o reconhecimento das interações estatais e não somente sociais dentro do construtivismo.

Liberalismo e síntese da teoria: a prioridade das preferências

Autor diz que alguns aspectos das teorias liberais, realista e institucionalista são compartilhados, e que as vezes ele não são elementos substitutivos, mas complementares, o que ele chama de síntese multicausal. Outra importante vantagem do retesamento da teoria é oferecer um modelo multicausal das teorias de RI mais claras do que as existentes atualmente. Muitos teóricos fazem este exercício colocando o realismo primeiro, e depois introduzindo as outras teorias. Moravcsik diz que esta convenção metodológica omite outras variáveis quando privilegia o realismo, o que torna um processo incoerente. Com isso, ele afirma que há algumas variáveis liberais que explicam certos casos em que as outras teorias não conseguem explicar, como a variação nas preferências e escolhas.
De forma que para o autor, o realismo e institucionalismo são limitados em explicar o ótimo de Pareto, e que o liberalismo não é apenas consistente, mas empiricamente significante. Enquanto o realismo e institucionalismo explicam parcialmente, o liberalismo consegue preencher algumas lacunas essenciais que essas outras teorias na conseguem. A explicação das políticas domestica, o liberalismo é a melhor teoria para explicar as preferências internas.
O comportamento estatal deve ser analisado como um processo de dois estágios constrangido pela escolha social. Primeiro os Estados definem preferências (melhor explicado pelos liberais), e em seguida debatem, barganham e brigam por acordos (bem explicado pelas outras teorias, assim como pelo liberalismo). No geral, ele diz que em explicações multicausais, há uma primazia pela teoria liberal.







Principais pressupostos do Intergovernamentalismo Liberal
Relação com o debate sobre Integração Regional
Formação de preferências nacionais
A formação da preferencia nacional ocorre primeiramente no âmbito doméstico e, posteriormente, o Estado barganha com outros Estados, para conseguir seu objetivo. As diferenças entre os Estados, no entanto, são relativizadas através da barganha, uma vez que esta consiste no mínimo denominador comum entre os Estados. Ou seja, os Estados definem suas preferências e depois barganham entre si.
Comportamento Racional do Estado
Para essa teoria, o Estado é visto como ao mesmo tempo racional e egoísta e por isso, busca a maximização dos ganhos, de forma que a relação custo-benefício dos processos de integração compensa a participação dos Estados nos processos de integração através da formação de preferências.
Estado como ator central
Consiste na visão do Estado como principal ator no sistema internacional, uma visão Estado-cêntricas.



MORAVCSIK, Andrew. Taking Preferences Seriously: A Liberal Theory of International Politics. International Organization 51, 4, Autumn 1997, pp. 513–553. Disponível em: <http://www.princeton.edu/~amoravcs/library/preferences.pdf>. Acessado em 10 de setembro de 2013.